Fatos e Falácias da Economia

Livro Fatos e Falácias da Economia

Basic Books,
Também disponível em: Inglês


Recomendação

Muito antes de Freako­nom­ics chegar às livrarias, Thomas Sowell já pop­u­lar­izava a economia utilizando uma linguagem simples. Em seu último livro, ele continua a iluminar a ciência sombria com alegria, apontando sua lanterna contra um punhado de falácias comuns dos decisores políticos e até mesmo de alguns economistas profis­sion­ais. Depois de descrever essas falácias, Sowell as apresenta na prática, discutindo urbanização, questões de gênero, igualdade, educação, raça, renda e de­sen­volvi­mento econômico. O resultado é um tônico estimulante que provavel­mente irá mudar a sua opinião sobre algumas das questões mais palpitantes da atualidade. BooksInShort recomenda esta leitura breve e esguia, para aqueles que não têm medo de submeter suas convicções à luz da evidência econômica.

Ideias Fun­da­men­tais

  • Os debates sobre as questões econômicas mais populares estão repletos de pensamento falacioso.
  • A “falácia de composição” ignora as alterações entre os grupos estatísticos.
  • A “falácia da mesmice” ignora as diferenças dentro de um grupo estatístico.
  • A “falácia da soma-zero” ignora a relação de ganho mútuo (ganha-ganha).
  • A “falácia das peças de xadrez” presume que os líderes podem planejar e colocar ordem em uma sociedade.
  • A “falácia dos recursos ilimitados” extrapola a partir de dados limitados.
  • Muitos dos males da urbanização são ilusórios.
  • As diferenças dos salários entre homens e mulheres podem ser explicados sem apontar para a discriminação.
  • A de­sigual­dade de renda não é tão ruim quanto afirma a mídia.
  • O racismo não é a principal causa da de­sigual­dade entre grupos raciais.
 

Resumo

A Fonte das Falácias

Em uma velha piada, dois amigos estão conversando na esquina de uma rua movimentada de Manhattan. Percebendo o tráfego frenético, um deles conta uma estatística. “Ouvi dizer que na cidade um homem é atropelado a cada 20 minutos”. “Puxa vida”, diz o outro amigo, “ele já deve estar cansado disso”. Como muitas piadas, esta contém uma verdade sutil, muitas vezes ignorada nas reportagens jornalísticas que relatam dados estatísticos: o membro de um grupo (“o homem”) geralmente muda, ainda que o grupo mantenha a mesma característica. Este construto, que poderia ser chamado de “falácia de composição”, é apenas um dos padrões de raciocínio capazes de induzir até as pessoas mais in­teligentes ao erro. Uma falácia relacionada é a “falácia da mesmice”, que pressupõe que os membros de uma categoria estatística são os mesmos em muitos aspectos, se não em todos. Por exemplo, generalizar sobre os rendimentos de jovens entre 18 e 24 anos é fácil. Mas nesta categoria alguns são formados e outros abandonaram a escola. Ao considerar as questões de diretrizes políticas, essa diferença pode ser crucial.

“As pessoas acreditam em certas coisas porque são com­pro­vada­mente verdadeiras. Mas também acreditam em muitas outras porque são con­sis­tentes com crenças amplamente difundidas e aceitas como substitutas dos fatos.”

Embora existam muitas falácias econômicas, as mais prevalentes são a “falácia da soma-zero”, a “falácia de composição”, a “falácia das peças de xadrez” e a “falácia dos recursos ilimitados”. Entendê-las pode ajudar você a ver as questões econômicas de forma mais clara.

A falácia da soma-zero pressupõe que se uma pessoa se dá bem, outra se dá mal. Às vezes, este é o caso, mas a falácia está em pensar que a maioria das transações econômicas são pautadas em uma mentalidade de ganho unilateral (ganha-perde), em vez de ganho mútuo (ganha-ganha). Por exemplo, se as nações de­sen­volvi­das vão indo bem, segundo a teoria, essa riqueza deve ter chegado às custas das nações menos de­sen­volvi­das. Estas nações devem ter sido exploradas. Geralmente, porém, as transações econômicas livres são ganha-ganha. Ambas as partes se beneficiam. Se uma das partes estivesse sempre em desvantagem, é de se esperar que depois de um tempo as pessoas caíssem em si e a atividade econômica cessaria. É verdade que as partes em uma relação econômica muitas vezes não obtém o resultado desejado, mas mesmo assim ambas ainda podem se beneficiar.

“As falácias não são sim­ples­mente ideias malucas. São no geral tanto plausíveis como lógicas, mas um tanto incompletas.”

A falácia de composição confunde os atributos de uma parte com os atributos do todo. Suponha que você esteja em um estádio assistindo a um jogo de futebol. Já que não pode sair do seu lugar para ver o lance com mais clareza, você se levanta. Ao perceberem sua vantagem, as outras pessoas vão fazer o mesmo. Logo, todos na sua seção vão se levantar e num piscar de olhos toda a multidão vai estar de pé. O resultado: Ninguém consegue ver melhor agora do que quando estavam todos sentados. Ficar de pé foi um movimento de soma-zero: você obteve uma vantagem inicial, mas em detrimento dos outros. E depois todos os torcedores se encontraram em uma situação de soma negativa, já que o grupo como um todo levou a pior porque todo mundo teve que ficar de pé. O que funcionou para você como uma das partes (“ficar em pé vai melhorar minha visão”), não funcionou para o todo.

“Muitas coisas desejáveis são defendidas sem ser considerado o fato mais fundamental da economia: os recursos são iner­ente­mente limitados e podem ter usos al­ter­na­tivos.”

Adam Smith percebeu a falácia das peças de xadrez. Smith criticou as pessoas que pensavam que poderiam “organizar os diferentes membros de uma grande sociedade com a mesma facilidade que a mão arruma as diferentes peças sobre um tabuleiro de xadrez”. No entanto, mais de dois séculos após o aviso de Smith, os decisores políticos ainda tentam colocar em prática várias formas de “engenharia social”. Normalmente, esses sistemas não funcionam porque, ao contrário das torres e cavalos, as pessoas têm vontades e desejos que muitas vezes entram em conflito com as teorias dos engenheiros sociais. Portanto, as experiências sociais tendem a ter consequências inesperadas, além do mais são dis­pendiosas e, em muitos casos, as pessoas que pagam o preço são aquelas às quais os planos procuravam ajudar.

“Algumas falácias populares (...) são seculares e foram refutadas há séculos, não importa que tenham sido repaginadas em uma retórica contemporânea para se adequar aos tempos atuais.”

A falácia dos recursos ilimitados tem uma série de variações, mas o tema comum entre elas é simples: a in­ca­paci­dade de pensar clara e conc­re­ta­mente sobre os efeitos de uma determinada política. Por vezes as percepções das pessoas sobre os resultados são provavel­mente muito animadoras. Por exemplo, a maioria das pessoas apoiam os gastos com saúde pública. Gastar um real extra com saúde é bom, certo? Bem, não nec­es­sari­a­mente. Pessoas tendem a esquecer que os recursos são finitos e todas as escolhas, incluindo as escolhas políticas, exigem equilíbrio e compensação. Por outro lado, o pensamento dos recursos ilimitados é, às vezes, pessimista. Só porque, digamos, um espaço verde está sendo ter­raple­nado não significa que estão acabando com toda a área verde da cidade. Pode ser um incidente isolado. Se você conseguir detectar essas falácias, terá facilidade em pensar claramente sobre alguns dos temas políticos mais in­qui­etantes da atualidade. Além disso, pode ajudar a defender-se de algumas ideias sem base, con­sid­er­adas eruditas, que surgem ao discutir questões rela­cionadas à urbanização, gênero, es­co­lar­i­dade, renda, raça e países em de­sen­volvi­mento.

Urbanização

Algumas pessoas pensam que as cidades se assemelham a um círculo do inferno de Dante. Os críticos da arquitetura reclamam da “expansão urbana” e da “feiura” dos subúrbios. Os críticos sociais reclamam da falta de habitação “acessível” na cidade e apontam para alta densidade dos bairros como sendo a causa da crim­i­nal­i­dade. Líderes comunitários urbanos condenam o trânsito crescente dos que trabalham na cidade e moram nos subúrbios. Embora as cidades e seus subúrbios tenham problemas, um olhar sobre a economia e a história do de­sen­volvi­mento urbano faz com que elas pareçam menos as­sus­ta­do­ras. É verdade que as cidades tendem a ser densas. Mas é isso que as cidades são: lugares onde as pessoas se reúnem para realizar negócios e criar uma cultura com­par­til­hada. Foi sempre assim. A Roma antiga tinha aprox­i­mada­mente o mesmo número de pessoas que Dallas tem hoje, mas os romanos viviam em cerca de dois por cento da superfície terrestre. Densidade não significa que as coisas sejam ruins, nem os subúrbios são maus só porque cobrem uma vasta área. Afinal, as pessoas têm de viver em algum lugar. Além disso, os esforços para conter o crescimento causam distorções econômicas. Pessoas ricas não querem moradias “baratas” (leia-se pequenas, de custo acessível) nas suas vizinhanças. Fazem lobby por leis restritivas e cinturões verdes. O resultado? Habitação mais cara para a classe média.

Gênero

Diz a sabedoria con­ven­cional que as mulheres têm desde sempre sido tratadas com injustiça no trabalho e recebem menos pela mesma função. Pior, estão sujeitas à discriminação no re­cru­ta­mento. Se não fossem as leis anti-dis­crim­inação, insiste a tradição, as mulheres estariam em situação ainda pior, já que os patrões conspiram abertamente contra elas. Certo? Não exatamente. Poucos negariam que as mulheres ganham menos que os homens. Ganham sim. A questão é por quê. Uma explicação é a discriminação gen­er­al­izada e o preconceito. Mas algumas outras explicações são mais plausíveis. Considere este exemplo: de acordo com um estudo do New England Journal of Medicine, os médicos ganham 41% a mais por ano do que as médicas. No entanto, de acordo com o estudo, jovens médicos do sexo masculino trabalham mais de 500 horas por ano, muito mais do que as do sexo feminino. Quando os pesquisadores ajustaram os dois grupos de acordo com horários, localização da es­pe­cial­i­dade e outros fatores, o diferencial da renda desapareceu. Outra pesquisa lançou mais luz sobre a questão: cerca de 37% das mulheres deixam o mercado de trabalho formal em algum momento de suas carreiras e um percentual semelhante trabalha em tempo parcial por algum tempo. Este padrão mostra-se repeti­da­mente, sugerindo que a escolha, não a discriminação, é responsável por grande parte da diferença de renda.

Educação

Para muitos, os tranquilos bosques das uni­ver­si­dades destoam do mundo dos negócios. Deve ser maravilhoso fazer parte de uma instituição livre das di­fi­cul­dades cor­po­ra­ti­vas. Afinal, são entidades sem fins lucrativos, motivadas por ideais mais elevados do que o dinheiro. In­fe­liz­mente, os fatos parecem contradizer tais devaneios falaciosos. Os professores muitas vezes não defendem os interesses dos alunos. Por que deveriam? Afinal, depois de obterem es­ta­bil­i­dade não podem ser demitidos. Além disso, membros do corpo docente controlam a maioria das uni­ver­si­dades sem fins lucrativos. Professores, por vezes, abusam desse poder, adotando livros de acordo com as propinas que recebem dos editores. E você já se perguntou por que todas as “melhores” disciplinas são dadas ao mesmo tempo, no meio do dia? Pos­sivel­mente é porque os professores efetivos querem chegar ao trabalho mais tarde e sair mais cedo. O resultado? Você não consegue se matricular nas matérias que deseja. E mesmo que consiga, não vai aprender muito. Os membros do corpo docente em geral não são promovidos com base nas suas habilidades de ensino, mas pelo seu prestígio e o fi­nan­cia­mento que geram para pesquisas. Nenhuma empresa so­bre­vive­ria caso funcionasse como uma uni­ver­si­dade.

Renda

Basta abrir o jornal ou ligar a TV para se defrontar com estatísticas sobre os rendimentos dos EUA. Por exemplo, os ricos estão prosperando enquanto os rendimentos médios estão estagnados e a classe média encolhe. Os ricos ficam mais ricos e os pobres mais pobres; os CEOs recebem salários ex­or­bi­tantes dado o pequeno retorno que trazem para os acionistas. Será tudo isso verdade, ou não? Normalmente, os números que apoiam estas afirmações baseiam-se em fatos. No entanto, esses números podem ser in­ter­pre­ta­dos de maneiras diferentes, levando a falácias comuns. In­fe­liz­mente, os ideólogos da direita e da esquerda adoram dar explicações que apresentam sim­ples­mente seu lado do argumento. A mídia também perpetua equívocos. Por exemplo, os jornais gostam de dizer que “a renda familiar” não aumentou nas últimas décadas. Essa frase oculta o fato de que as famílias têm números diferentes de membros. Da mesma forma, os es­pe­cial­is­tas falam da “renda” dos pobres, sem con­tabi­lizar os apoios do governo, que em alguns casos representam mais de dois terços das suas receitas.

Raça

Poucas questões são mais con­tro­ver­sas do que a raça e algumas inquietações trazem ainda mais confusão. Muitos crêem que a escravidão foi causada pelo racismo e que isso é a principal razão da diferença atual dos rendimentos entre negros e brancos nos EUA. A sabedoria corrente diz que discriminação e racismo sempre andam de mãos dadas. No entanto, observar cautelosa­mente os números é a melhor maneira de dar sentido às coisas. Usar ex­clu­si­va­mente a raça como um clas­si­fi­cador pode esconder outras diferenças importantes entre os grupos, como a idade. A idade média dos afro-amer­i­canos é cinco anos mais jovem que a da população em geral. Pessoas mais jovens tendem a ganhar menos, o que ajuda a explicar porque a renda dos negros pode ser menor.

“Como todo ser humano, as cidades são imperfeitas e seus benefícios têm custos, algo aceito com nat­u­ral­i­dade pela maioria das pessoas. Entretanto, para alguns são motivo de lamentos, cruzadas e o que é pior, ‘soluções’.”

Outros grupos raciais também são muito mais jovens do que a idade média dos EUA, par­tic­u­lar­mente os asiáticos (idades médias de 23 anos para japoneses e 16 para sul-asiáticos) e a idade “cor­rela­ciona-se es­tre­ita­mente com os rendimentos”. Grupos raciais também têm histórias diferentes. Cerca de 60% dos japone­ses-amer­i­canos nasceram nos EUA, contra menos de um terço dos outros asiáticos. Isso pode ter um enorme impacto sobre a renda e a carreira, uma vez que os tra­bal­hadores nativos tendem a estar muito mais fa­mil­iar­iza­dos com a sua sociedade do que os imigrantes. Quando lhe ap­re­sentarem “fatos” raciais, preste atenção nos números ao invés de ater-se a questões emocionais.

Países em De­sen­volvi­mento

Por que alguns países são tão ricos e outros tão pobres? Muitos acreditam que a resposta deve ser “exploração”. Quando não for o caso talvez a resposta seja a falta de ajuda externa. Se os países ricos fizessem um pouco mais, as nações pobres poderiam prosperar. Certo? Embora essa interpretação falaciosa seja atraente, a realidade é diferente. Para começar, a discussão sobre as nações ricas e pobres é muitas vezes colocada em termos de “primeiro” e “terceiro” mundos. Mas isso é pouco útil. Alguns países podem estar localizados em regiões ricas, sem que sejam nec­es­sari­a­mente ricos. Afinal, os países diferem em sua geografia. Alguns têm rios que ligam os centros comerciais, enquanto outros são ilhas isoladas. Alguns têm climas que são propícios para a agricultura, enquanto outros são estéreis e secos. Da mesma forma, os países têm diferentes tradições e culturas. Alguns têm uma tradição de lei e ordem, enquanto outros parecem propensos à ilegalidade. Colocar tais fatos um ao lado do outro explica muita coisa, apesar de não eliminar estas diferenças.

Sobre o autor

Thomas Sowell é acadêmico residente da Hoover Institution da Uni­ver­si­dade de Stanford. Ele é também o autor do livro Basic Economics.